quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Impeachment sem fatos agride o princípio fundante do Estado de Direito: a soberania popular

Buscar o impeachment sem que haja fatos implica agressão grotesca ao princípio fundante do Estado de Direito, o da soberania popular.

Paulo Teixeira*
Roberto Stuckert Filho/PR
Conceitos jurídicos muitas vezes são fluidos, indeterminados, gerando, portanto, certa margem de discricionariedade para quem os interpreta. Essa órbita discricionária, porém, não pode em qualquer hipótese traduzir uma espécie de “aleluia jurídico”, permitindo ao exegeta extrair desses conceitos o que bem lhes aprouver, acomodando-os às demandas do momento. Zonas de certeza, positiva ou negativa, são sempre limites interpretativos que não podem ser rompidos.
Um desses conceitos fluidos é o de “crime de responsabilidade”, acomodado nos artigos 52 e 85 da Constituição Federal como fato gerador do impeachment de autoridades, dentre as quais o Presidente ou a Presidenta da República.
O impeachment nasceu na Inglaterra, consubstanciando, à época, em um processo parlamentar voltado à responsabilização política e criminal de altas autoridades públicas. Ao longo dos anos, contudo, dentro dos padrões próprios de uma ordem jurídica estribada no direito costumeiro, foi substituído pela moção de desconfiança e caiu em desuso. Ressurgiu nos Estados Unidos da América, com o advento da Constituição de 1787, a qual, contudo, separou a responsabilidade política da criminal: esta a cargo de processos judiciais, aquela a cargo de processos parlamentares.
O Brasil, como se vê, é herdeiro dessa tradição. Assim, um intérprete afoito e pouco afeito às práticas democráticas iniciadas com o Estado de Direito criado pela Constituição de 1988 poderia sacar a conclusão: se o processo é parlamentar, não há limites, não há regras, não existem condições. Nada mais enganoso.
Conceitos fluidos não atribuem àqueles que o operam poder nenhum que se sobreponha à Constituição. E esta, ao abordar crimes de responsabilidade, desfiou um rol de hipóteses motivadoras, as quais, por sua vez, só podem ser consideradas à luz das demais cláusulas constitucionais, como, entre outras, o devido processo legal.
Explica-se. Os que cogitam a possibilidade de impeachment da Presidenta Dilma Rousseff o fazem amparados nas causas constantes dos incisos V, VI e VII, do art. 85 da Constituição Federal, a saber:
V - a probidade na administração; 
VI - a lei orçamentária; 
VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
Os conceitos incorporados pelas cláusulas constitucionais em apreço já não são tão vagos assim, ou seja, possuem uma carga semântica que lhes denota claramente o conteúdo. Probidade administrativa, a primeira delas, só pode significar a violação a um dos dispositivos da lei 8.429/92, que trata das “sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências”. Ora, a Presidenta da República não foi, nem está sendo, sequer investigada pela prática de atos da espécie. Em outras palavras, não há, para o Direito, nem cogitação dessa possibilidade.
A hipótese do precitado inciso VI, da lei orçamentária, diz respeito às contas públicas, sendo certo que o art. 70 da Constituição prescreve que “a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional”, com auxílio do Tribunal de Contas. É bem de se ver: o Congresso Nacional não julgou as contas da Presidenta da República, em nenhum de seus exercícios, tornando, ainda uma vez, incogitável a possibilidade de impeachment com arrimo em tal previsão. Ademais, o sistema de controle de contas é amplo, contemplando diferentes possibilidades, como a sustação de contratos e a imputação de débitos, entre outras. Só uma coleção de condenações dessa natureza poderia render possibilidade de uma medida excepcional como o impeachment. É bom lembrar, a Presidenta Dilma Rousseff não foi condenada ou processada uma vez sequer.
A derradeira hipótese, de cumprimento das leis e decisões judiciais, abriga duas possibilidades. A primeira, de cumprimento das leis, que, à evidência, suporia, no mínimo, um processo judicial transitado em julgado em que se apontasse uma conduta presidencial eivada de ilegalidade. Esse processo não existe. A segunda, de cumprimento das decisões judiciais, pressuporia a condenação por um crime de desobediência a uma ordem judicial. Isso tampouco existe ou existiu.
O mandato político decorre de uma investidura popular, abrigada sob os influxos da previsão do parágrafo único do art. 1º da nossa Constituição, segundo o qual “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”
O impeachment tem, assim, caráter excepcionalíssimo, fazendo com que suas causas motivadoras devam sempre ser interpretadas restritivamente. Buscar o impeachment sem que haja fatos — não os produzidos midiaticamente, mas os demonstrados judicialmente — implica agressão grotesca ao princípio fundante do Estado de Direito, o da soberania popular.
*Paulo Teixeira é mestre em Direito do Estado pela USP, deputado federal (PT/SP) e vice-líder do Governo na Câmara dos Deputados.


Créditos da foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Texto original: CARTA MAIOR

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Direita apresenta seu programa de horrores

Editorial do site Vermelho:

Arrocho salarial, ataques contra o funcionalismo público, aposentadoria aos 65 anos de idade, privatizações, “estado mínimo” – a direita perde o acanhamento e volta a defender seu programa nefasto para o país!

Nas últimas eleições, desde a vitória de Luíz Inácio Lula da Silva e das forças populares, democráticas e patrióticas em 2002, o PSDB e a direita não tiveram nem a coragem, nem a honestidade, de apresentar claramente o programa de horrores que defendem. 

O ex-presidente tucano Fernando Henrique Cardoso chegou ao constrangimento de, em quase todas as eleições, reclamar dos candidatos de seu partido que escondiam os “feitos” de seu governo.

Um evento ocorrido na semana passada revelou que aquele acanhamento da direita parece estar sendo superado pelos tucanos e seus aliados, que agora voltam a defender aqueles “feitos” e a pregar seu aprofundamento num eventual novo governo tucano.

O evento foi o seminário ocorrido na quinta-feira (17), no Senado, intitulado "Caminhos para o Brasil", promovido pelo PSDB e pelo Instituto Teotônio Vilela.

O economista grão-tucano Gustavo Franco foi franco na ocasião e disse ter chegado a hora de “falar de privatização de peito aberto”.

É um bom sinal! Nos últimos meses a conjuntura política indica uma virada para a direita e ela permite relativizar o temor dos conservadores e neoliberais, que passam a mostrar sua cara verdadeira, revelando o que pretendem impor ao país na hipótese remota de conseguirem voltar à Presidência da República.

Essa queda da máscara da direita merece ser saudada pela razão simples de que muitos – sobretudo entre os brasileiros mais jovens – parecem já não se lembrar do descalabro que foram os dois mandatos do presidente tucano e neoliberal Fernando Henrique Cardoso. Ele conseguiu a proeza de quebrar o Brasil pelo menos três vezes, em 1998, 2001 e 2002. E o custo da crise foi imposto aos brasileiros, ao povo e aos trabalhadores! O desemprego e o arrocho salarial foram a consequência mais grave daquela crise, resultado dos ajustes impostos para enfrentar o fracasso das políticas econômicas neoliberais que favoreciam a especulação financeira.

O programa defendido pelos tucanos agora reapresentado é o mesmo que infelicitou o Brasil naqueles anos em que os tucanos governaram o país. 

O objetivo principal desse programa é favorecer o grande capital, os ricos, os interesses das classes dominantes e do imperialismo.

Os participantes daquele seminário emplumado – José Serra, Aécio Neves, José Aníbal, Armínio Fraga, Gustavo Franco, Samuel Pessôa, Mansueto Almeida entre outros – foram unânimes no diagnóstico da crise e das medidas que querem impor para superá-la.

A principal causa da crise seria, para eles, o que chamam de “intervencionismo estatal” – isto é, o uso da força do Estado e do governo para fomentar o desenvolvimento que, na opinião deles, deve ser deixado à ação sacrossanta do “mercado”. Isto é, do grande capital e seus interesses. 

São unânimes em defender o “estado mínimo”, como sempre – que deve, como manda a velha cartilha conservadora, ficar à margem da economia!

O receituário contra a crise também é defendido em uníssono por eles: reduzir o salário mínimo e acabar com a lei que garante aumentos reais para os trabalhadores, eliminar a legislação trabalhista e impor a anacrônica tese de que o negociado vale mais do que o legislado – isto é, a CLT é jogada na lata do lixo e os direitos dos trabalhadores nela assegurados passam a depender de negociações entre os patrões e empregados! 

Voltam a insistir na velha pretensão conservadora de desvincular a relação entre os valores dos benefícios da Previdência Social e o salário mínimo, querem impor o limite de 65 anos de idade para a aposentadoria, e defendem a volta do rejeitado fator previdenciário. 

Querem aprofundar as privatizações, e o principal alvo é a Petrobras – um antigo compromisso dos neoliberais com seus patrões norte-americanos, para os quais querem entregar sobretudo o pré-sal. Outro alvo é o Mercosul, inaceitável para eles, que pretendem transformar em área de livre comércio.

Em relação aos funcionários públicos, outra unanimidade tucana é a pretensão de acabar com a estabilidade estatutária e permitir que os funcionários sejam livremente demitidos, de acordo com a vontade e disposição do governante de ocasião.

Em relação às determinações mais gerais da política econômica, insistem que o governo precisa obter um superavit primário (a economia feita para saciar a ganância da especulação financeira por juros) equivalente a 3% do PIB – cerca de R$ 165 bilhões em valores atuais! Isso para pagar juros!

Os trabalhadores e os setores democráticos, progressistas e patrióticos precisam estar atentos às pretensões da direita. Denunciar seu programa nocivo e levar ao conhecimento do povo e dos trabalhadores aquelas ideias prejudiciais de retorno a um passado condenado nas ruas e nas urnas. 

Há consenso sobre a necessidade de mudanças – para frente, não para trás! Para liquidar os privilégios da direita e da especulação financeira, que precisam urgentemente serem ultrapassados, no campo da política e da economia. As chances para isso se fortalecem na medida em que o povo tome conhecimento da pretensão da direita de reforçar seus privilégios, à custa do bem-estar dos trabalhadores e do setor produtivo. O Brasil precisa ir adiante, e não voltar para trás!

Texto replicado: BLOG DO MIRO

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

A pergunta que espera uma resposta dos eleitores do governo

Muitos eleitores estão desesperançados, outros sem saber o que fazer e ainda outros tentando juntar os trapos. Falta agregação e esperança.


*José Carlos Peliano

Perigo e oportunidade. Assim, o símbolo da escrita chinesa define crise. Dois caracteres diferentes se juntam, cada qual com sua simbologia, para expressar um momento intrincado, difícil, delicado.

Em situações como essa, o bom senso sugere ter calma e paciência para esperar que a tormenta se dissipe. Eventualmente engolir alguns sapos, retirar-se para bem longe onde não se ouça a trovoada, até mesmo tentar entender o porquê de tudo isso, enquanto se recupera o fôlego.
Muitos de nós já vem passando por essas providências à espera da mudança do atual cenário político brasileiro. Como diria nossas avós, a vaca ainda não foi para o brejo. É possível, portanto, evitar que ela se atole e aí ficar mais difícil recupera-la, às vezes até impossível.
Os eleitores da presidenta eleita votaram por sua permanência por mais quatro anos. Não só porque seu programa de governo anterior tinha uma ação social forte e consolidada via programas tais quais Minha Casa, Minha Vida, Pronatec, Bolsa Família. 
Mas também pelo fato de acenar novas medidas de expansão e melhoria da cobertura e atendimento social, além do econômico a ele vinculado como investimentos do PAC, entre eles, para infraestrutura e energias alternativas, ambos seguidos da criação de mais empregos e salários.
A crise internacional acabou trazendo seus efeitos mais perto do país ao final de seu primeiro mandato, embora a política econômica anterior tenha evitado que tal acontecesse durante anos e sustentado o tranco. Reservas consideráveis em moedas estrangeiras, comércio internacional razoável e situação interna confortável garantiam a situação político, institucional e econômica do país.
A crise na Zona do Euro, a retração da economia chinesa e o lengalenga da economia americana acabaram com a tranquilidade brasileira. As transações externas minguaram, os investimentos estrangeiros reduziram e a nossa moeda desvalorizou gradativamente.
Em cima dessa realidade, que a mídia conservadora juntamente com seus analistas de plantão não enxergam porque não querem ver, soma-se a eleição da presidenta para seu segundo mandato. Em vitória apertada, mas confirmada pelo Tribunal competente segundo a legislação vigente.
Mas a oposição contestou e ainda contesta com a testa cheia de marcas de marradas nas paredes, nas ameaças, nas bandeiras da turma do impeachment. Seu líder derrotado não aceita o resultado, considera-se o rei do país. De quê?
A nossa Justiça, em geral, não tem feito a devida justiça. A começar pelo chamado mensalão, seguindo a Lava Jato, a proporção esmagadora dos denunciados vem do partido do governo. Nenhum da oposição. 
Embora durmam nas gavetas das instâncias judiciais muitos processos com informações contra membros da oposição sem andamento, sem perspectivas, candidatos ao esquecimento ou à prescrição. Sem falar dos estapafúrdios ritos processuais seguidos nos respectivos julgamentos e formação dos processos. Cujas críticas são confirmadas por juristas renomados.
Em meio a essa maçaroca de desleixos, descasos e arranjos a mídia conservadora não perde tempo. Cai em cima diuturnamente com falsas informações, ocultações de notícias, desvirtuamento de manchetes e opiniões. Até mesmo seu braço estrangeiro estampa aqui e ali análises parciais e tendenciosas sobre a situação interna. Os interesses falam mais alto. Tudo contra o governo eleito democraticamente pelo povo. De novo, pela maioria dos eleitores.
A saída encontrada pela presidenta e seu governo foi a de tentar se aproximar da oposição para poder minimamente governar. Convocado então o ministro da Fazenda, um dos próximos da turma dos indignados. Deve ter ela pensado, melhor chegar perto deles para ver se é possível administrar do que ficar longe e não sentir a real temperatura do alvoroço.
Tem se dado mal a presidenta com a escolha feita. O partido do governo golpeado pelas denúncias de corrupção. O ministro fazendo o jogo da oposição até o recente pacote de maldades, a oposição continua com pé firme a favor do impeachment ou da renúncia da presidenta, a Justiça continua de olhos vendados não vendo nada da oposição e a mídia não perde nem o bonde, nem a esperança de ver o circo pegar fogo.
E a crise internacional deve levar tempo para se dissipar. A maré não está para peixe. Mato sem cachorro. O governo está acuado, amarrado, sem ter muito a fazer nesse cenário totalmente adverso.
E os eleitores da presidenta então? Muitos deles estão combatendo nas redes sociais a ferro e fogo em batalhas diárias contra tudo isso. Já que a mídia conservadora joga contra, as redes sociais jogam a favor. E bem.
Mas os demais eleitores estão quietos, calados. Muitos desesperançados, outros sem saber o que fazer e ainda outros tentando se juntar os trapos aqui e ali. Falta agregação, união de esforços e esperanças. Já que a oposição se junta oficialmente a favor do impeachment por que os eleitores de Dilma também não se aproximam a favor da defesa de seu mandato?
Essa a pergunta que não quer calar. Quer uma resposta dos eleitores de Dilma. Caso contrário, pode vir a acontecer o contrário. Uma dificuldade política e institucional tão grande para governar que, de duas uma, ou conseguem com a ajuda de todas as instâncias antidemocráticas o impeachment, ou, o que pode dar no mesmo, impeçam que a presidenta governe livre e desimpedida, mas amarrada como fantoche.
Está mais que na hora de os eleitores da presidenta se mobilizarem e se juntarem para combater o rolo compressor que segue o rastro enlouquecido da oposição. Melhor apoia-la agora, dando-lhe um voto de confiança, e negociar melhores condições de trabalho e salários depois. 
É preciso dar um basta e mostrar a força dos que querem democracia, mesmo com as dificuldades da hora. Caso contrário, o grande risco que se corre é o país voltar às mãos dos que têm interesses com o desmanche da Petrobras no comando da política do petróleo nacional. Além de se ver o estado voltar a ser privatizado, como ocorreu nos governos antes de Lula.
O futuro há de ser diferente do que foi nos tempos da ditadura, onde muitos dos que hoje estão se dizendo democratas do lado da oposição, estavam bandeados também ditando regras para o lado dos militares.
Como democracia implica em negociação que se faça então com o governo. Sindicatos, associações, grupos populares de todos os matizes, parlamentares fora da oposição, religiosos, enfim, todos aqueles que se sintam ultrajados pelo espetáculo sujo e de mau gosto patrocinado pela oposição se encontrem, se unam e definam aberta e democraticamente manifestações de apoio ao governo eleito. E repúdio aos zumbis derrotados pelo voto. O futuro do país pode estar em nossas mãos.
*colaborador da Carta Maior

Texto original: CARTA MAIOR

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Petrobras: produção de petróleo bate novo recorde - quase 3 milhões de barris

Aí o 'fracasso' da Petrobras e do pré-sal. Aí a Petrobras que 'não consegue dar conta'. E tem gente que pretende entregar esse tesouro às multinacionais.


O Cafezinho e Blog Fatos e Dados, da Petrobras

Aí o "fracasso" da Petrobras e do pré-sal.
Aí a Petrobras que "não consegue dar conta".
A cada mês, um novo recorde de produção, suprindo a energia necessária à economia brasileira.
A velocidade com que a Petrobras vem explorando os novos poços do pré-sal já bateu todos os recordes internacionais. Ou seja, é a melhor companhia de petróleo do mundo.
E tem gente que pretende entregar esse tesouro às multinacionais, que tem um custo maior (ou seja, pagarão menos impostos) e menos know how de produção (produzirão menos).
Uma pena ainda que queiram transformar a necessária investigação contra a corrupção na estatal, investigação essa que começou após a demissão, pela presidenta Dilma, da maioria dos corruptos, numa conspiração midiático-judicial com vistas a aplicar um golpe de Estado.
***
No blog Fatos e Dados.
Produção de petróleo e gás natural cresce e bate recorde em agosto
16.Set.2015
No mês de agosto, a nossa produção de petróleo e gás natural, no Brasil e no exterior, atingiu a marca de 2,88 milhões de barris de óleo equivalente por dia (boed), um recorde histórico, 0,8% superior ao recorde anterior de 2,86 milhões boed alcançado em dezembro de 2014. Esse volume é também 4,5% maior que o registrado em agosto de 2014 (2,76 milhões boed). Em relação ao mês anterior (julho), houve um crescimento na produção de petróleo e gás natural de 3,1%, quando foram produzidos 2,80 milhões.
A produção total de petróleo e gás natural no Brasil foi de 2,69 milhões boed, 3,1% superior ao mês anterior (2,61 milhões boed), representando também novo recorde de produção nacional (0,6% superior ao recorde anterior de 2,67 milhões boed atingido em dezembro de 2014). Vale destacar que a produção total que operamos no país, incluída a parcela operada para empresas parceiras, ultrapassou pela primeira vez os 3 milhões de barris de óleo equivalente por dia, atingindo 3,01 milhões boed. Nossa produção de petróleo foi de 2,21 milhões bpd (3% acima dos 2,14 milhões bpd produzidos no mês anterior), constituindo-se, assim, a segunda melhor marca histórica.
O crescimento reflete a entrada em operação em 31 de julho do FPSO Cidade de Itaguaí, ancorado em Iracema Norte, área localizada na porção noroeste do campo de Lula, no pré-sal da Bacia de Santos. Essa plataforma tem capacidade para processar diariamente 150 mil bpd de petróleo e 8 milhões de m³/dia de gás natural. Adicionalmente, a retomada da operação de plataformas que estavam com paradas programadas para manutenção também foi um fator que contribuiu com o bom desempenho do mês.
A produção de gás natural no Brasil, excluído o volume liquefeito, também apresentou novo recorde de 77,2 milhões m³/dia (3,6% acima do mês anterior).
Novos recordes no pré-sal
Na área do pré-sal, foram atingidos dois novos recordes: o de produção diária que operamos, com volume de 896 mil bpd registrado em 19 de agosto; e o de produção mensal que operamos, que alcançou 859 mil bpd no mês.
Produção de óleo e gás no exterior
No exterior foram produzidos 192 mil boed, 3,8% acima dos 185 mil boed produzidos em julho, devido, principalmente, ao retorno das operações da plataforma do Campo de Saint Malo, no Golfo do México norte-americano. A produção de petróleo foi de 101 mil bpd, 5,2% acima dos 969 mil bpd produzidos em julho e a produção média de gás natural no exterior foi de 15,4 milhões m³/dia, 1,9% acima da produção de julho, que foi de 15,1 milhões m³/dia.

Texto original: CARTA MAIOR

domingo, 13 de setembro de 2015

Delegado da Polícia Federal fez manipulação grotesca para incriminar Lula

A instrumentalização de investigações policiais para fins partidários ou privados é incompatível com a democracia.

Jeferson Miola

O delegado da Polícia Federal Josélio Azevedo de Souza fez uma manipulação grotesca no despacho entregue ao STF com o objetivo principal de incriminar o ex-presidente Lula e livrar a barra do PSDB.
 
O documento de 218 páginas não é uma peça técnica de investigação criminal, mas um libelo recheado com apreciações e ilações políticas. É um texto que dispensa a oposição golpista e o chefe da conspiração, FHC, de fazer o serviço sujo.
 
O despacho foi protocolado no STF às 13:34 horas de 10/09, mas não surpreende se tiver sido entregue antecipadamente na redação da revista Época, do grupo Globo, porque antes do próprio Lula saber da armação, a “denúncia” já bombava no noticiário online.
 
A manifestação do delegado Josélio integra o volume XII do Inquérito nº 3989, instaurado no STF para investigar políticos implicados na Operação Lava Jato que gozam de foro privilegiado. O volume XII vai da página 2442 à 2660 do Inquérito, cujo arquivo podendo ser acessado aqui; nele faltam as folhas 2466, 2467 e 2468 – pode ser um detalhe irrelevante, mas em se tratando da PF, toda cautela é recomendável.
 
Adiante são reproduzidos alguns trechos, conservando os destaques e grafias do calhamaço original:
 
- em depoimento, Pedro Henry Neto, do PP, afirmou “QUE jamais tratou da nomeação de PAULO ROBERTO COSTA com o então Presidente LULA; QUE, igualmente, não tem conhecimento se PEDRO CORRÊA e JOSÉ JANENE trataram deste assunto com o Ex-Presidente; ...” [pág. 2446 do Inquérito];
 
- depoimento de Paulo Roberto Costa: “QUE, indagado sobre os motivos que lhe levam a crer que a Presidência da República tinha conhecimento sobre os comissionamentos proporcionados a partir da Diretoria de Abastecimento da PETROBRÁS, afirma que decorre ‘do tempo em que PAULO ROBERTO COSTA ficou na Diretoria de Abastecimento, e do conhecimento de vários integrantes do partido, tanto do PP, quanto do PT e do PMDB sobre o assunto’; QUE apesar disso o declarante afirma não dispor de nenhum elemento concreto que permita confirmar tal suposição” [pág 2650].
 
Apesar disso, o delegado da PF, numa lógica capciosa, conclui: “Vê-se, portanto, que os colaboradores PAULO ROBERTO COSTA e ALBERTO YOUSSEF presumem que o ex-Presidente da República tivesse conhecimento do esquema de corrupção descortinado na PETROBRÁS em razão das características e da dimensão do mesmo. Os colaboradores, porém, não dispõem de elementos concretos que impliquem a participação direta do então presidente LULA nos fatos” [na mesma página 2650].
 
Em depoimento, Paulo Roberto Costa afirmou “QUE, com relação ao mesmo [Deputado Eduardo da Fonte, do PP], sabe ainda que este participou, juntamente com SERGIO GUERRA, das reuniões para pôr fim à CPI da PETROBRÁS, e que resultaram no pagamento de Dez milhões de reais pagos pela Construtora QUEIROZ GALVÃO, na pessoa de IDELFONSO COLARES, conforme já explicitado em Termo de Colaboração próprio” [pág 2594].
 
O delegado Josélio, entretanto, livra o PSDB, apesar da implicação direta do ex-presidente do partido: “Segundo se depreende dos fatos que ensejaram sua instauração, houve a construção de um esquema de distribuição de recursos ilícitos a agentes políticos de pelo menos três partidos políticos, PP, PMDB e PT, ..” [pág 2537].
 
Na página 2654, outra conclusão tendenciosa do delegado tucano: “Ainda segundo PEDRO BARUSCO (fls. 156), o esquema foi institucionalizado no ano de 2003, ou seja, trata-se de um esquema que perdurou por quase 10 anos”. É bem conhecido o depoimento deste funcionário corrupto neste mesmo inquérito, revelando que o sistema de corrupção na PETROBRÁS – que está sendo decididamente investigado no governo do PT –, nasceu lá em 1997, na gestão do FHC.
 
A Polícia Federal, a pretexto duma duvidosa “autonomia funcional”, foi aparelhada por setores da corporação que atuam como um Estado dentro do Estado: com regras, procedimentos, princípios e critérios próprios – acima das Leis e da Constituição.
 
Os precedentes são complicados. Recentemente, o Diretor-Geral da PF, delegado Leandro Daiello concedeu uma entrevista – não desautorizada pelo Ministro da Justiça – na qual se apresentava como um quinto poder da República, ao lado do Executivo, do Legislativo, do Judiciário e da mídia.
 
A manipulação da PF no Inquérito da Lava Jato não representa apenas um ataque à figura e à honra do ex-presidente Lula, porque é também uma violência à democracia e à estabilidade política e institucional.
 
O silêncio oficial ante um ato de tamanha gravidade enfraquece a democracia e o ideal da sujeição das polícias à ordem democrática. A instrumentalização de investigações policiais para fins partidários ou privados é incompatível com a democracia.

Texto original: CARTA MAIOR

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Das vaias à ovação: médicos cubanos ganham preferência no Brasil

Pesquisa revela que 87% das pessoas elogiaram a atenção e a qualidade do atendimento dos cubanos. Na média, a nota recebida pelos médicos foi 9. 

Erikson Walla do Portal Vermelho


Unidade de Saúde da Família de Cajazeiras XI, manhã da última segunda-feira de agosto. Uma escada estreita leva ao pouco iluminado 1º andar, onde está um dos cômodos mais procurados no local: o consultório de número 5. A porta branca da sala, fechada até 2013, é aberta, desde então, muitas vezes ao dia. Observa-se, porém, um intervalo de tempo significativo entre um girar de maçaneta e outro. Neste ínterim de abre-fecha-abre-fecha, com quase nenhuma variação, a cena se repete: após a saída de um paciente, um homem pardo e de meia idade surge, sorridente, de prontuário na mão, para um sonoro anúncio de quem é que será o próximo a entrar. O nome de quem anuncia está em uma placa fixada na frente da porta: “Dr. Rafael – Médico”.

A fila, do lado de fora da sala, é grande. À espera está a vendedora Eurides Silva, de 26 anos, que soube da boa fama do médico e resolveu tentar uma consulta com ele. Queria falar do seu problema na tireoide. Como não havia marcado previamente, esperou todos terminarem para ir pedir um atendimento extra a Rafael. E conseguiu. O médico parecia não se importar com os poucos minutos que faltavam para a hora do almoço. Com o mesmo sorriso, abriu a porta para Eurides e para, pelo menos, mais três outras pessoas que, certamente, não arredariam dali sem conseguir falar com ele. “Normalmente, eu tenho que ‘brecar’ e pedir às pessoas pra voltar depois”, afirma Elzanete Mangueira, gerente da unidade de saúde.

Elza, como é mais conhecida, não diz com um tom autoritário. A intromissão nos atendimentos do médico é cordial e é uma maneira de tentar poupá-lo de uma excessiva carga de trabalho, até porque, na unidade, há mais outros três médicos. “Aqui, temos uma cota para determinados atendimentos. Dr. Rafael, por exemplo, deveria atender por dia 14 pacientes e mais três ou quatro emergências, mas, se deixar, ele atende muito mais. Ele não atende pela agenda, mas pela necessidade do paciente. Ele não quer deixar voltar, mas a gente sabe que isso nem sempre é possível porque é humanamente impossível um médico atender a 20 ou 30 pessoas em um dia. Se deixar, ele atende”, completa a gerente.

O que justifica a fama e a grande procura pelo médico não são os atendimentos extras, mas o que acontece lá dentro da sala, quando a porta se fecha. Com a cadeira do paciente posta ao lado da mesa, Rafael cria um clima favorável à proximidade e à intimidade com quem o procura. Durante a consulta, ouve mais do que fala. Quer saber dos pacientes como é a alimentação, qual o histórico médico da família, qual o modo de vida que leva. Pega na mão, toca o rosto, examina minuciosamente. Na vez de Eurides, pegou um bloco de papel e uma caneta e desenhou a glândula da tireoide para mostrar à vendedora. Ele queria que ela entendesse o funcionamento do sistema endócrino e como o problema na tireoide se desenvolveu. Eurides entendeu direitinho e saiu encantada. “Os outros [médicos] nunca fizeram como ele”, declarou.

Dr. Rafael, de sobrenome Villa, é cubano. Chegou ao Brasil em 2013, junto à primeira turma que partiu de Cuba para a missão de integrar a etapa inicial do programa ‘Mais Médicos’, do Governo Federal brasileiro. A iniciativa surgiu diante do grande déficit de profissionais de medicina no país, com o objetivo de ampliar emergencialmente o atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS), principalmente nos rincões do Brasil, e investir na formação de novos profissionais. Naquele período, o Ministério da Saúde (MS) revelou que faltavam 54 mil médicos no Brasil. A média era de 1,8 profissionais para cada grupo de mil habitantes. Para efeitos comparativos, a média da Inglaterra era de 2,7 para mil, segundo o MS.

A recepção não foi boa. Rafael e os conterrâneos chegaram sob vaias e protestos, principalmente vindos de colegas, médicos brasileiros. Um dos episódios mais tensos aconteceu na chegada a Fortaleza (CE), quando um grupo dos profissionais locais chamou os cubanos de ‘escravos’ e ‘traidores’. Em Salvador (BA), onde Rafael desembarcou, a recepção foi calorosa, houve até um grupo de apoio, mas as notícias do que acontecia em outras cidades chegavam aos ouvidos de todos. “Foi algo muito ruim. Somos tão médicos como eles e não viemos aqui para tomar postos de trabalho. Viemos ajudar a todos, em função da precariedade da saúde brasileira, que está muito necessitada”, contou o cubano, ao lembrar da chegada.

A necessidade a que Rafael se refere era real na Unidade de Saúde da Família de Cajazeiras XI, localizada em uma das áreas mais carentes da capital baiana. Cajazeiras XI é um dos setores do bairro de Cajazeiras, que possui dimensões de uma cidade e é, por isso, considerado o maior conjunto habitacional da América Latina (AL). Em 2010, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) contou 60 mil habitantes – 100 mil quando se considera os 40 mil moradores dos setores de Fazenda Grande, que, quase sempre, são incluídos no conjunto de Cajazeiras. Pela grande população e pela distância do Centro de Salvador, a impressão que se tem é que a localidade possui uma vida independente em relação ao município. Era esquecida, dizem os moradores, ao lembrar que, até 2013, não existia médico nas unidades de saúde.

A cerca de 70km dali, uma outra comunidade tem uma história parecida para contar. São Sebastião do Passé é um município da Região Metropolitana de Salvador (RMS). Lá, vivem 45 mil pessoas, segundo a última contagem do IBGE. Antes do ‘Mais Médicos’, a Unidade de Saúde da Família Péricles Rodrigues, na sede, funcionava sem atendimento médico. A mudança só aconteceu com a chegada de quatro médicos cubanos, enviados ao município para suprir a carência. São três homens e uma mulher. A única mulher do grupo é Yadira Giraudy, uma negra de cabelos ondulados e sorriso fácil, escalada para o trabalho da sede. Na comunidade, que é menor do que o bairro de Cajazeiras, a médica se tornou, ao longo desses dois anos, uma rainha.

Quem faz acreditar no título de majestade são os pacientes, que se derretem ao falar da médica cubana. Uma delas é Dona Maria Ionice Cerqueira, aposentada de 61 anos. Fez questão de falar à reportagem sobre a ‘doutora’, para quem não economiza nos elogios, mesmo recebendo ‘broncas’ dela, de vez em quando. É que Dona Maria Ionice às vezes descuida dos muitos problemas que possui: doença de chagas, osteoporose, colesterol alto, diabetes e quase-cegueira. “Sou acompanhada por ela e toda terça-feira eu estou aqui. Ela é muito boa, se preocupa muito com os pacientes. Além de examinar, ela escuta. Por causa do meu problema nas vistas, ela não deixa eu vir sozinha e nem quer que eu fique na rua sozinha. Só a preocupação dela…”, conta a aposentada, que teve a última frase interrompida pela própria emoção. Os depoimentos positivos sobre a médica se repetem na fila da unidade de saúde.

Mas o início não foi fácil para Yadira e Rafael. Além da tentativa de parte dos médicos brasileiros de criar uma imagem negativa dos profissionais estrangeiros junto à sociedade, os cubanos esbarraram, também, no português, pois a língua oficial de Cuba é o espanhol. “Quando cheguei, ninguém entendia nada. Tinha que falar muito devagar e muitos queixavam de que não entendiam a médica, mas, pouco a pouco, fui ganhando a confiança deles e melhorou muito. Hoje, me sinto muito bem com eles”, conta, aliviada, Yadira. No caso de Rafael, muitas vezes ele chegou a chamar os enfermeiros para que pudessem auxiliar na comunicação. Como português e espanhol são línguas parecidas, os dois médicos logo conseguiram desenvolver o ‘portunhol’ e os percalços com os diálogos diminuíram radicalmente.

Superadas as dificuldades iniciais, Yadira tratou de apresentar à população e à equipe da unidade de saúde algumas das características da medicina cubana que poria em prática: prevenção, humanismo e acompanhamento do paciente. De todas, a última surpreendeu mais. Duas das primeiras perguntas que a enfermeira brasileira Maria Juliete de Oliveira ouviu da médica foram: “Como são as visitas? Vamos fazer para todos os pacientes?” De queixo caído, a enfermeira tentou explicar que existiriam dificuldades pela grande quantidade de pacientes. Mas com a facilidade de estar e morar em uma comunidade menor – Rafael mora em um bairro diferente do que trabalha -, a médica insistiu e passou a fazer visitas às casas para conhecer e orientar os hábitos dos moradores, principalmente em relação à alimentação. Não dá para fazer visitar toda a comunidade, mas ela vai a todos aos grupos considerados prioritários pela equipe.

Preferência nacional

As histórias de Rafael e Yadira, marcadas pela transformação das vaias iniciais em ovações, na Bahia, não são as únicas. Pelo menos é o que revelou uma recente pesquisa desenvolvida pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) sobre a relação dos brasileiros com os profissionais do ‘Mais Médicos’, em que os cubanos são a grande maioria (são 11.429 dos 14.462 médicos participantes do programa). Feito em 700 municípios, entre novembro e dezembro do ano passado, o levantamento ouviu 14 mil pessoas, que deram, na média, a nota 9 ao atendimento oferecido pelos cubanos nas unidades públicas de saúde (55% dos entrevistados deram a nota 10). Outros 87% elogiaram a atenção e a qualidade do atendimento; 77% garantiram que tiveram uma boa comunicação com os profissionais estrangeiros.

Na Bahia, são cerca de 1.363 médicos em atuação pelo programa federal. Um relatório inédito da Secretaria Estadual de Saúde, a Sesab, apontou uma relação entre o aumento do número de médicos no estado, através do ‘Mais Médicos’, e uma melhora significativa dos índices de qualidade de vida dos baianos. Segundo o documento, de 2013 para 2014, houve uma redução da taxa de mortalidade infantil (de 16,35% para 15,39), de internações motivadas por condições relativas à atenção básica (de 42,02% para 40,90%), por Acidente Vascular Cerebral, o AVC, em pacientes de 30 a 59 anos (de 6,93% para 5,29%) e por diabetes e suas complicações (de 7,0% para 6,0%). Houve, ainda, um amento do número de bebês nascidos vivos de mães que fizeram sete ou mais consultas de pré-natal, durante a gravidez (de 46,97% para 50,83%).

Os profissionais do ‘Mais Médicos’ estão, segundo o MS, em 4058 dos 5570 municípios brasileiros, o que representa uma cobertura de 73% do território nacional. Entre os locais de atuação, estão 34 distritos indígenas. A estimativa é de que, hoje, 134 milhões de pessoas estejam sendo atendidas por médicos do programa. A presença de médicos fixos nas comunidades é estratégica, segundo o Ministério, porque, como a atenção básica é a porta de entrada dos que procuram atendimento médico, 80% dos casos que chegam às unidades são resolvidos no próprio local, sem que seja preciso o deslocamento e sem que haja a superlotação de unidades de atendimentos mais complexos.

“Antes [do ‘Mais Médicos’], não tínhamos a possibilidade de garantir a cerca de 63 milhões de brasileiros o acesso à atenção primária na saúde. Com o Mais Médicos, que conta com a cooperação da OPAs [Organização Pan-Americana da Saúde], nós temos efetivamente garantido a cada brasileiro o direito de uma atenção primária qualificada. Por meio do Programa, conseguimos levar profissionais onde vivem as pessoas com maior vulnerabilidade, nas periferias das grandes cidades brasileiras, nos quilombolas, assentamentos rurais, aldeias indígenas, na floresta amazônica, onde os brasileiros precisam de médicos”, disse o ministro Arthur Chioro, através da página do Ministério da Saúde na internet.

As principais vozes contrárias ao programa ‘Mais Médicos’ são das entidades que representam a classe médica. Desde 2013, elas têm defendido que a iniciativa não iria resolver o profundo problema da saúde no Brasil. Na Bahia, o presidente do Sindicato dos Médicos (Sindmed), Francisco Magalhães, foi procurado para comentar a pesquisa divulgada pela UFMG. Magalhães disse que estava sendo informado da pesquisa pela reportagem, mas que, mesmo sem um conhecimento prévio, refutava a metodologia e os resultados obtidos pelo levantamento da Universidade mineira.

“Nós estamos vivendo, no país, um quadro em que se verifica que as condições de trabalho dos profissionais de saúde estão piores. Estamos com problemas diversos”, defendeu o presidente do Sindmed-BA. Durante as visitas às unidades de saúde, a reclamação identificada pela reportagem em relação às condições dos locais foi sobre o irregular recebimento de medicamentos. Yadira, por exemplo, contou que em São Sebastião do Passé chega a faltar remédios para doenças crônicas [como hipertensão e diabetes], em alguns períodos. A médica alerta para os riscos que a irregularidade causa porque o uso dos medicamentos não pode ser interrompido e grande parte dos pacientes, segundo ela, não pode comprar.

Em nota, a Secretaria Estadual de Saúde informou que “a maior parte dos medicamentos destinados ao tratamento de hipertensão de diabetes é de responsabilidade do próprio município. A Secretaria Municipal de Saúde é quem faz a aquisição”. A Secretaria de Saúde de São Sebastião do Passé foi contatada, mas, até o fechamento da reportagem, não apresentou um posicionamento. Sobre as críticas do presidente do Sindmed, a Sesab não se posicionou.

Missões cubanas

Os cubanos chamam as emissões de médicos para outros países de missões. A cônsul de Cuba no Nordeste do Brasil, Laura Pujol, explica que a iniciativa é antiga e consegue traduzir o espírito da ilha localizada na América Central. “Não é uma questão recente, mas algo que se estende na História. Desde os anos de 1960 nós enviamos para onde precisa da nossa ajuda solidária. Isso tem a ver com princípios e com a formação que nós temos, de entender que a solidariedade é uma pedra fundamental de nossa cultura. Para nós, não é dar o que sobra, mas compartilhar o que se tem”, afirmou a cônsul. Mais de 128 países já receberam médicos de Cuba e, atualmente, há mais de 68 mil médicos prestando serviços pelo mundo. Além do Brasil, outros países que receberam grandes missões cubanas foram Afeganistão, Venezuela e diversos países do continente africano, segundo o consulado. Antes de virem para o Brasil, Rafael e Yadira participaram de outras missões. Os dois estiveram na Venezuela e em Honduras.

O Consulado Regional de Cuba está instalado em Salvador e realiza um trabalho de acompanhamento das condições de vida e trabalho dos médicos em toda a região Nordeste do Brasil. De acordo com Laura, são feitas de 15 a 20 visitas por mês aos municípios pelos próprios cônsules – além dela, há mais dois. Como a demanda é grande e a equipe não consegue estar em todas as localidades, o consulado resolveu promover, além das visitas, encontros dos médicos que atuam nas mesmas regiões. Nas ocasiões, que são celebrações com elementos da cultura cubana, os cônsules aproveitam para fazer os levantamentos sobre a vida nos municípios. “Queremos que eles sintam que o nosso governo está preocupado e está ali para qualquer situação que eles precisarem”, explicou Laura.

Para viabilizar o ‘Mais Médicos’, o Governo federal conta com parcerias dos estados e municípios. Ao município, cabe garantir a permanência dos médicos instalados nas comunidades, oferecendo, por exemplo, moradia, alimentação e transporte. Durante as entrevistas, Rafael e Yadira não reclamaram das condições oferecidas pelas prefeituras, mas foi possível observar que elas poderiam ser melhores. Maria Juliete, a enfermeira da unidade São Sebastião do Passé, contou que Yadira já reclamou de ter que dividir uma pequena casa com os outros três médicos conterrâneos. A casa alugada para Rafael pela Prefeitura de Salvador fica em Itapuã, um bairro distante de onde ele trabalha. Ele mora com a esposa, Gaya, também médica de Cuba, que trabalha na mesma unidade – e, assim como ele, é bastante concorrida. O casal vai e volta de ônibus, enfrentando engarrafamentos no trajeto, que chega a ser feito em até 1 hora. Se morassem na própria Cajazeiras XI, a qualidade de vida, certamente, seria outra.

A permanência dos médicos estrangeiros no programa é, em média, de três anos. Como já estão no Brasil desde o início, há mais de dois anos, a partida já está se aproximando. Rafael e Yadira, embora se sintam bem acolhidos, não veem a hora de matar a saudade da família que ficou em Cuba – ambos possuem filhos. A equipe de saúde das unidades em que eles trabalham preveem que a falta será grande, proporcional ao legado que os cubanos deixarão. As equipes garantem que vão seguir com os ensinamentos recebidos, principalmente os relacionados à prevenção. Difícil será, certamente, a partida dos médicos para as comunidades. Quando questionados sobre isso, os pacientes preferem nem pensar. Foram cativados e esse pode ter sido o grande erro dos cubanos durante a missão. Como ensina a história do ‘Pequeno Príncipe’, mundialmente conhecida: “tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”.

Agradecimentos a Lázaro Guerreiro, Antônio Barreto e Cida Meira.

Texto original: CARTA MAIOR

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Estadão e a sua maioria de 25%

O título é uma aula de como tentar apertar números para extrair leite de madeira. A maioria foi deixada de lado para mostrar a opinião da minoria.


Portal Vermelho, por Humberto Alencar

Uma pesquisa conduzida pelas entidades Rede Minha São Paulo e SampaPé consultou 107 estabelecimentos na avenida, em relação à medida do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, de abrir a Avenida Paulista à circulação de pedestres e proibir a circulação de automóveis nos fins de semana. O tema foi alvo de reportagem do vetusto jornal paulistano O Estado de S.Paulo.


O título é uma aula de como tentar apertar números para extrair leite de madeira. "25% dos comerciantes são contra fechar Paulista para carros, mostra pesquisa". Fantástico, não? A maioria foi deixada de lado, em lugar dela foi incensada a opinião da minoria. Faça as contas. Se 25% são contrários, então os outros 75% devem ser a favor ou, no mínimo, indiferentes.

Aí, o leitor curioso vai passeando na reportagem até encontrar, lá embaixo, quase perdida, a informação de que, "questionados se eram favoráveis à abertura da Paulista para pedestres, 50% disseram que sim, 25% se mostraram indiferentes e 25% afirmaram ser contrários. Em relação ao impacto nas vendas, 46% apontaram impacto positivo, 25% indiferente e 29% impacto negativo. "

Sensacional. Então as vendas tiveram impacto positivo para 46% dos comerciantes? Então a medida do prefeito foi excelente para quem mantém o comércio aberto na avenida nos fins de semana? Mas o Estadão, o vetusto, não quer deixar o pobre leitor concluir isto. Quer levá-lo pela mão no sentido contrário.

Para isto, utiliza da opinião do diretor de relações institucionais da Associação de Lojistas de Shoppings (Alshop), Luís Augusto Ildefonso da Silva. Antes de tudo, Silva afirma que a instituição "não tem opinião formada porque os próprios lojistas não sabem dizer o que vai acontecer". 

Espremido pela reportagem, Silva faz uma suposição: "A atividade produtiva está bastante paralisada e fraca. Qualquer modificação que traga transtorno maior seguramente pode prejudicar a intenção já baixa que o consumidor tem", disse. Frise-se: "pode", sem afirmar que vai. Mas o mais interessante é que ele fala da atividade "produtiva". Oi? Mas não é o comércio da Paulista que está em jogo?

Não me perguntem porque a imprensa deste tipo corre célere para a falência. Eu nem questiono os "coleguinhas" do Estadão, que são forçados a repetir ad nauseam e de forma acrítica o que o jornal determina nas suas pautas. O jornalismo acabou. Infelizmente, o emprego destes jornalistas também vai acabar, tamanha a distância do que se publica da realidade.

Texto original: CARTA MAIOR

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

Como a PM paulista tornou-se máquina de assassinar jovens



De repente, a força tarefa montada para apurar a chacina de Osasco — na qual 19 jovens foram assassinados — foi atropelada pelas investigações da Polícia Militar (PM).

A maior suspeita era de PMs envolvidos.

As investigações da PM atuaram em duas frentes: para atrapalhar os aspectos materiais e para comprometer os aspectos formais da investigação.

Na primeira frente, atrapalharam a colheira de provas e expuseram nomes de testemunhas. A partir do vazamento, todas elas passam a ser juradas de morte.

Na frente formal, caso as investigações levem a nomes de policiais de menor patente, com toda certeza serão anuladas nos tribunais superiores, já que crimes de morte só podem ser investigados pela Polícia Civil (PC). À PM cabe apenas investigar infrações administrativas.

Escancara-se, assim, um dos grandes desafios nacionais, que mais cedo ou mais tarde teria mesmo que ser encarado: o do enfrentamento do poder paralelo incrustado nas PMs, cuja manifestação mais trágica é a extraordinária taxa de letalidade nas suas ações. Em muitos lugares — especialmente em São Paulo — a PM tornou-se uma máquina feroz de assassinar jovens de periferia, escudada na mais absoluta impunidade.

O papel dos P2

Os problemas da PM começaram quando transformaram o P2 em agentes policiais.

Os P2 são uma espécie de polícia judiciária, responsáveis por levantar as infrações disciplinares e propor correções de rumo à polícia. Os PMs usam fardas, os P2, não. Os PMs são cidadãos comuns; os P2, os PMs de confiança.

Gradativamente houve uma alteração na sua atuação, conforme se contará mais à frente, tornando-se a linha de frente das operações extralegais da PM, como agentes de confiança do oficialato.

Essa máquina de assassinato foi montada de forma gradativa.

Na década de 70 consolidou-se a imagem da PC corrupta e da PM violenta. Vem de lá os conflitos entre as duas polícias.

Na linha de frente, os conflitos se manifestavam no próprio atendimento policial. O PM prendia o suspeito, levava para a delegacia e lá havia a primeira frente de conflito.

Há duas espécies de policiais civis.

O policial sério é garantista — isto é, não está lá meramente para apurar culpas, mas para apurar a verdade. Ele precisa seguir o Código de Processo Penal (CPP), requisitar laudos e perícias. Já a PM não se prende a códigos e busca culpados.

Além disso, não havia interesse em fortalecer a PC, porque a própria PM pretendeu desde sempre controlar o ciclo completo da apuração do crime. No passado, houve inúmeros casos de efetivos da PM cercarem delegacias para fazer valer a vontade do oficial, exigindo flagrante em determinados casos, contra a opinião do delegado, que não via motivos para tal.

O problema maior surgiu com a segunda espécie de policial civil, o corrupto.

Ainda na década de 70 a PM deu-se conta de que prendendo o contraventor e entregando-o em uma delegacia — em geral ligado ao jogo de bicho e ao bingo — apenas valorizava a corrupção da PC.

Talvez por efeito-demonstração, as companhias da PM que atuavam na região da Santa Ifigênia começaram a praticar venda de segurança. Havia reuniões formais entre os capitães e comerciantes. Os oficiais alegavam que o Estado não tinha verbas. Os comerciantes montavam então uma associação incumbida de recolher recursos para financiar os PMs. Foi o início de um modelo que se expandiu para outras regiões da cidade e deu início ao crescente mercado de segurança, dominado por companhias de propriedade de oficiais da PM.

Hoje em dia, é comum a venda casada de segurança por essas empresas. Tipo, se a contratarem garante-se pelo menos duas vezes por dia a presença de viaturas da Rota transitando pela região.

A segurança de quem pagava

A venda de segurança começou a dar na vista, porque regiões e cidadãos passaram a ser divididos entre os que podiam e os que não podiam pagar.

Para administrar a opinião pública, a maneira encontrada por setores da PM e das companhias de segurança foi a criação de grupos de extermínio.

Se surgiam problemas em determinada região, mandavam um esquadrão na calada da noite que executava meia dúzia de pessoas, quadrilheiros ou não. A ação servia para alertar os quadrilheiros: mudem-se! Para a população, passava a ideia de guerras de quadrilha.

Aos poucos, o modelo de execução foi sendo aprimorado.

Quando surgem problemas em determinadas regiões nobres, os grupos de segurança privada combinam entre si e aquele de outra região vai até o local, procede à matança e à desova dos corpos em outro lugar.

Esse mesmo procedimento passou a ser adotado por setores da PM.

Quando precisa matar alguém, setores da PM valem-se de três equipes. A primeira, executa as vítimas. A segunda, vai até o local e esconde as provas. A terceira comparece para registrar o crime.

A eficácia do modelo é assegurada por dois instrumentos.

O primeiro, o sistema de gestão avançado, que permite programar a ida ou retirada de policiais da área. Se um grupo de extermínio planeja uma ação em determinada área, basta acionar o sistema para tirar o policiamento do entorno do alvo.

O segundo é a falta de uma polícia técnica independente. O Instituto Médico Legal não tem verba própria. Depende da Polícia Civil, porque até hoje não foi instituída uma polícia científica, conforme preconizado pela Constituição.

No geral, os PMs desenvolvem laços de compadrio com médicos. De posse da escala de médicos, é fácil identificar aqueles menos exigentes nos laudos.

Os crimes de maio de 2006 só cessaram quando médicos do Conselho Regional de Medicina correram para o IML (Instituto Médico Legal) para acompanhar as autópsias. É nesse momento que aparecem as provas mais objetivas que podem levar ao criminoso.

Os crimes de agosto

Não foi por acaso que Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) exigiu providências do governo brasileiro tão logo foram divulgadas as notícias sobre a chacina de Osasco. Nos organismos internacionais, há consenso de que as autoridades públicas perderam o controle sobre as PMs.

A primeira atitude do Secretário de Segurança Alexandre de Moraes foi a constituição de um grupo de trabalho de 50 pessoas, entre policiais civis e procuradores estaduais visando apurar os crimes. Não incluiu ninguém da PM. Parecia que, pela primeira vez, seria rompida a blindagem.

Quando a PM colocou seu bloco na rua, o Secretário calou-se. Dele não se ouviu mais nenhuma palavra, nenhuma declaração.

A chacina de Osasco tornou-se um divisor de águas. Nos próximos dias se saberá onde reside o poder de fato em São Paulo: se no Palácio Bandeirantes ou se no quartel da PM.

Dessa resposta dependem centenas de rapazes de periferia que serão executados nos próximos meses, caso o governo de São Paulo atue de forma pusilânime.

Luís Nassif
No GGN